quinta-feira, 30 de maio de 2013

Construindo o Polí(p)tico Superpopular - Somos todos apropriadores - Parte 1


Apropriação e antropofagia. Até que ponto pode-se dizer que estes dois conceitos são distintos, senão opostos? A resposta “fácil” consiste em depreender o primeiro termo como uma espécie de “ato passivo”, inerte em seus resultados práticos - ou seja, um não-ato, a mera atitude -, enquanto o segundo, à luz deste mesmo pensamento, pode ser compreendido como seu oposto - o ato em si, a atividade. Têm, assim, em comum, sua relação com o fator externo, separando-se e aninhando-se em pontos opostos de um mesmo espectro no que diz respeito à reação ao fator em questão. Há ainda uma terceira via, a do repúdio da influência externa, que por ora não nos interessa. Uma outra visão não diferencia um conceito do outro em nível semiótico, no sentido de que, suponho, se trata de uma abordagem relativista da apreensão de um fator externo por determinado organismo, seja ele político, artístico, social etc.

Um exemplo da diferença entre estas duas visões, no contexto da arte e, mais especificamente, da música brasileira, reside na forma como cada uma aborda o movimento da Jovem Guarda. Enquanto a primeira se atém ao caráter  reprodutivo do movimento, compreendendo o desejo daqueles artistas como meio de alcançar um público já familiarizado com uma sonoridade estrangeira e priorizando, portanto, as motivações mercadológicas de seu surgimento, a segunda busca uma análise mais ampla. Semionauta que sou, atenho-me a esta segunda abordagem. Se pode ser dito que, em seus aspectos formais, a música da Jovem Guarda, inicialmente se assemelhava ao som que vinha de fora, apenas o fato de se tratar de uma miríade de artistas brasileiros cantando em português aquele tipo de música já denota a diferença entre uma coisa e outra.


Importar uma sonoridade significa reconhecer a si mesmo naquilo que vem de fora e construir em cima disso, encontrar outros caminhos de realizar um mesmo tipo de trabalho (até o ponto em que as obras tidas como “derivativas” desenvolvam aspectos únicos, como viriam a fazer os artistas da Jovem Guarda ao longo da década de 1960). Reproduzir, ali, era o mesmo que dizer “nós também podemos fazer isso” e constituía uma postura tão ativa perante a influência externa quanto o Tropicalismo, por exemplo, adotaria alguns anos depois.

A diferença de linguagem entre um movimento e outro talvez se dê apenas no nível do imediatismo de um em justaposição à evolução gradual do outro. E reside também aí a única diferença que identifico entre a apropriação e a antropofagia: tal imediatismo nasce da origem brasileira do termo “antropofagia”, quando aplicado à atividade cultural, e da necessidade política do resgate deste conceito. Em outras palavras, passadas já muitas décadas desde então, é impossível não caracterizar a música da Jovem Guarda como brasileira, mas a ruptura provocada pelo Tropicalismo, naquele contexto e naquele tempo, foi tida imediatamente como um novo caminho, tal qual a Bossa Nova o fizera mais cedo. A antropofagia, portanto, nada mais é do que uma forma imediata de apropriação.


O conceito de apropriação, por sua vez, está presente em todas as culturas, de ambas as formas - imediata ou não - e remonta aos primórdios de nossa História. O historiador inglês Eric Hobsbawm analisou superficialmente esta política de trocas culturais em artigo sobre os 500 anos da descoberta das Américas, do qual é pertinente que se destaque o seguinte trecho:


“A música popular de massa da sociedade industrial atualmente provém, basicamente, do hemisfério ocidental, enquanto a música transatlântica de alta cultura ainda depende da Europa, desde o Colon de Buenos Aires ao Lincoln Centre de Nova York. A cultura popular é a cultura universal do nosso século. É compartilhada por todos, inclusive pelo mais descomprometido dos intelectuais. A alta cultura pertence às minorias, que às vezes são mesmo muito pequenas. Ao dizer isso não estou emitindo um juízo de valor. Por outro lado,  estou sugerindo um ‘choque de culturas’. De fato, se há um choque de culturas genuíno entre o Novo e o Velho Mundo, está aqui, entre um Novo Mundo cuja força principal e motor dinâmico é popular e um Velho Mundo cujo impacto cultural no Novo foi esmagadoramente dirigido pelas elites e governantes.” (HOBSBAWM, 2005, p. 411)



No artigo em questão, o autor se detém sobre as trocas entre as Américas e a Europa, mas não é difícil encontrar casos semelhantes em outras partes do mundo. Faz sentido, então, continuarmos usando o termo brasileiro “antropofagia”, ou ganhamos mais ao reconhecermos o aspecto global deste tipo de prática?  

Pedro Capello. continua...

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Vertigens Superpopulares - Figurino Orquestra Superpopular



"O jeans é o tecido do povo, é popular, é superporpular." Manoela Moura, figurinista da OSP

“Vestir é um ato mágico”, Hélio Oiticica

“Enfeitar-se é um ritual tão grave. A fazenda não é
mero tecido, é matéria de coisa. É a esse estofo que com
 meu corpo eu dou corpo. Ah, como pode um simples
pano ganhar tanta vida? ”
Clarice Lispector,  O ritual,  em  A Descoberta do Mundo

Através da moda, observamos um tempo: um tempo que está marcado pelo mais atual, pela presença das tecnologias, por uma linguagem internacional e por uma valorização cultural. A teoria fixou o foco em quatro funções práticas das roupas: utilidade, decência, indecência (atração sexual) e ornamentação. George Sproles acrescenta mais quatro funções: diferenciação simbólica, filiação social, autoaprimoramento psicológico e modernidade.
Assim como a moda, o figurino tem essas oito funções. A diferenciação está que o figurino é dependente não comercialmente a um texto/conceito e utilidade como necessidade física. A partir disso, se questiona ao que estamos dependente hoje, nós, o popular.

Popular
po.pu.lar
adj m+f (lat populare) 1 Pertencente ou relativo ao povo; próprio do povo. 2 Comum, usual entre o povo: Linguagem popular. 3 Adaptado à compreensão ou ao gosto do povo. 4Promovido pelo povo; que provém do povo: Manifesto popular.5 Originado entre o povo ou por ele composto ou transmitido: Música popular; dança popular. 6 Que representa ou pretende representar a vontade do povo: Partido popular; governo popular. 7 Que é do agrado do povo; que tem as simpatias, o afeto do povo. 8 Notório, vulgar. 9 Democrático. 
 
      Povo.
O que pertence ou é relativo ao povo em relação à roupa? O que é comum, usual ao povo? O que o povo usa e o que ele gosta? O que é promovido pelo povo? O que é originado entre o povo ou por ele composto ou transmitido? O que representa ou pretende representar a vontade do povo? O que é do agrado do povo? O que tem sua simpatia e afeto? O que e notório, vulgar? O que é democrático?

O jeans.
A calça jeans já nasceu globalizada. O inventor era natural da Letônia. Quem financiou a ideia foi o alemão Strauss. A patente foi americana. O tecido, francês: o brim, rústico, feito da mescla do algodão, surgiu na cidade de Nîmes no século XVII. O nome do tecido de Nimes, brim, acabou sendo abreviado para Denim. Os italianos foram os primeiros a importar esse tecido, para confeccionar os uniformes dos marinheiros que trabalhavam no porto de Gênova. Esses genoveses eram chamados de genes pelos franceses. E depois, de jeans pelos americanos. Assim surgiu o nome conhecido até hoje.


 A calça jeans, item tão básico quanto fashion, uma das peças mais democráticas do vestuário, um objeto de consumo que revolucionou a maneira de se vestir, de pessoas de várias gerações. Eleita pela revista americana Time como "a vestimenta do século XX". O jeans é o tecido do povo, é popular, é superporpular. O povo usa, gosta. É o tecido que representa o trabalhador em todas as suas possibilidades. Pode ser vulgar, pode ser notório, pode ser chique, esportivo e até básico.  Do tecido usado para cobrir carroças ao ícone da moda. Junto com esse tecido popular, a proposta de figurino também conta com a valorização da brasilidade presente nas roupas, através dos ricos trabalhos manuais que o país tem em todos os cantos. Crochê, renda, bordados, ponto-cruz, fuxico, tricô, glitter, lantejoulas, penas e diversos materiais que vão enriquecer o jeans. 

Outra junção a essa composição é o espelho. Uma superfície muito lisa e que permita alto índice de reflexão da luz que incide sobre ele. Esse material é visto em todas as casas, em globos de espelhos em boates, em banheiros, em lojas, enfim, em todos os lugares aonde o povo, as pessoas permeiam. O espelho vai refletir as projeções, o que vai resultar em um jogo de brilhos, cores e movimentação para as peças.Com isso o conceito do figurino é trazer para as roupas da orquestra o de mais superpopular em matérias e tecido. Algo que o povo usa e abusa sem perceber.

Outra questão importante é a modelagem. Ela vai buscar em todas as referências visuais da moda, televisão e cinema no Brasil, selecionando o de mais emblemático e superporpular, sendo direcionada para a personalidade de cada integrante do grupo. A “estimulação erótica” que está diretamente relacionada com o caráter sensual (visual e tátil) da moda quando se trata de vestimentas, desenvolveu esse duplo valor até fazê-lo despontar. Esta intensa dimensão tátil sugerida pelas roupas feitas com materiais diversificados: as plumas, transparências, rendas e as exibições de partes do corpo, complementam-se com a distância dos brilhos e dos espelhos. O corpo, ao ser entregue à espetacularização, converte-se em uma extensão da tecnologia, que passa a funcionar como uma prótese, experimentando em si mesmos a tese de McLuhan de que os meios são uma “extensão do corpo”. 

Caetano Veloso vestindo um parangolé

    Resultado de todas essas questões que abordam o figurino, o jeans, os trabalhos manuais, a modelagem diferenciada para cada persona, a questão masculino/feminino, os espelhos, a renda, as cores, rosa, azul, branco, e por fim tudo isso se dá no espaço através do movimento dessas roupas. Através da movimentação dos integrantes com a roupa é que se dá o figurino, fazendo uma relação através do movimento com o trabalho de Oiticica, Parangolé. Parangolé são capas, estandartes, bandeiras para serem vestidas ou carregadas pelo participante de um happening. As capas são feitas com panos coloridos (que podem levar reproduções de palavras e fotos) interligados, revelados apenas quando a pessoa se movimenta. A cor ganha um dinamismo no espaço através da associação com a dança e a música. A obra só existe plenamente, portanto, quando da participação corporal: a estrutura depende da ação. A cor assume, desse modo, um caráter literal de vivência, reunindo sensação visual, táctil e rítmica. 

    O participante vira obra ao vesti-lo, ultrapassando a distância entre eles, superando o próprio conceito de arte, mas que fique claro, ao vestir o Parangolé o corpo não é o suporte da obra. Oiticica diz que se trata de "incorporação do corpo na obra e da obra no corpo". O interesse de Oiticica, ao criar o Parangolé, não foi outro senão o de levar o indivíduo ao dilatamento de suas capacidades artísticas, para a descoberta de seu centro interior criativo, de sua espontaneidade expressiva adormecida, condicionada ao cotidiano. E, termino aqui, com as palavras de Bergson, que sintetizam a experiência Parangolé:


Ao libertar e acentuar esta música, eles hão de impô-la à nossa atenção; farão com que venhamos a inserir-nos nela, como passantes que entram numa dança. E por aí impelir-nos-ão a vibrar nas profundezas de nosso ser, algo que só estava esperando o momento de vibrar.

Finalmente, a movimentação no espaço faz acontecer o figurino no palco, a troca da luz com os integrantes e o rebatimento para a plateia. O que gera a sensação de vertigem, de os indivíduos girarem à sua volta e que ele próprio gira.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Extrapopulares Superordinários - Cenografia DEMO 1.0


A proposta partiu de uma ideia simples de construir um movimento de retirar das coisas do lugar, e ao mesmo tempo coloca-las no lugar certo. Com esse movimento Duchampiano, conseguimos um olhar, saudosista recente. Estes objetos, representam à primeira vista, um momento de relembrança da rotina das pessoas até chegarem ao encontro/show. Pequenos fragmentos que usam desses totens como força motriz. Esses objetos em suspensão trazem momentos anteriores e muito antes passados pelo público.
Eles se chamam “Extrapopulares Superordinários”, devido ao choque das palavras, superpopular e extraordinários.
Extrapopulares, por serem aquém das pessoas, estão no pensamento coletivo, na memória afetiva e são figuras estereotípicas de estágios, fases e detalhes da rotina/vida. Um travesseiro nos remete a sono, cama, dormir, sexo, aconchego, infância. Já uma cadeira de praia, calor, sol, amigos, cerveja.
A derivação da palavra mais o objeto nos transpassam as mil possibilidades.
Superordinários por serem objetos normais e banais, mas que tem seu poder por estarem em local ao reverso. Estão separados e “endeusados” no cenário, como fotos em um álbum, ou pequenas relíquias da humanidade. Colecionismo, encantamento, encantar, colocar em um canto, dar encanto, dar um poder ao objeto por estar encantado.

Uma primeira proposta seria cobrir os objetos com palavras a que eles remetem. Eles viriam com peso simbólico e resultado. Mas descaracteriza-los com tinta branca é uma maneira de universaliza-los, e ampliar a chegada do efeito em um publico mais variado. A simples menção ou visão de um objeto específico nos traz a mente, momentos marcantes ou pequenos lapsos de memória recente da rotina.

Os “Extrapopulares” do dia a dia são o ovo colorido do botequim, um banco de praça no topo de um morro, ver uma coisa que sempre esteve lá, mas descobri-la ou redescobri-la no espaço, um detalhe.
Fazer com que os integrantes tragam objetos próprios para o grupo dos superordinários, funcionaria como agente de memória coletiva, um brinquedo de infância ou algo específico como uma roupa ou um lustre, contribuiriam com essa massa ativa de fragmentos.
Encontrar em cada objeto, um momento do cotidiano sagrado, extrair deles, momentos de amor e beleza no cotidiano seria algo que gostaria de chegar com a cenografia para a Orquestra Superpopular.





quarta-feira, 8 de maio de 2013

É tudo agora ao mesmo tempo!!!!!!!!!!!!!!!

Estamos nesses últimos meses preparando o nosso espetáculo de 2013!

A data já está marcada e contamos com a sua presença no dia 05 de julho, para prestigiar o grande show da Orquestra Superpopular na Arena Dicró. Acompanhe semanalmente as nossas novidades por aqui e diariamente pelo facebook!

05 de julho de 2013! O grande show da Orquestra Superpopular na Arena Dicró!!!